sexta-feira, 3 de julho de 2015

 Giras & Rituais

A Umbanda não tem, infelizmente, um órgão centralizador, que a nível nacional ou estadual, dite normas e conceitos sobre a religião ou possa coibir os abusos. Por isso cada terreiro segue um ritual próprio, o que faz a diferenciação da qualidade de um para outro. Entretanto, a base de todo terreiro tem que seguir o principio básico do bom senso, da honestidade e do desinteresse material, além de pregar, é claro, o ritual básico transmitido através dos anos pelos praticantes. Com este tópico para esclarecer, transmitimos, sem nenhum segredo o ritual que nós praticamos.

GIRAS

No sentido de trabalho significa reunião de vários espíritos de uma mesma categoria. As giras podem ser festivas, de trabalho, de treinamento, fechada ou aberta e especifica. Antes das giras propriamente ditas, deve ser feita uma "abertura dos trabalhos" para que o ambiente seja devidamente preparado. Apresentaremos um modelo de abertura de gira em capítulo a parte.
Festiva ­ é aquela em que se presta uma homenagem ao Orixá/Entidade do dia. Nela pode-se puxar outras vibrações, separadamente;
De trabalho ­ são giras realizadas regularmente para o atendimento de consulentes;
De treinamento ­ pode ser realizada junto com a gira de trabalho ou em dia especifico. Nela se processa o desenvolvimento mediúnico dos iniciantes que serão trabalhados pelas entidades incorporadas ou por médiuns feitos, através da vibração de seus guias, sem incorporação;
Aberta ­ é uma gira onde se toca para duas ou mais categorias de espíritos. Nela podem trabalhar, ao mesmo tempo, Caboclos, Pretos Velhos, Ibeijada, etc. Cada médium trabalha com a entidade que desejar se manifestar.
Fechada ­ nessas giras trabalha-se com uma "linha" de cada vez. Somos mais favoráveis a este tipo de gira por não haver cruzamento de energia, assim existindo melhor aproveitamento dos fluidos por parte dos médiuns;
Neste caso, chama-se uma única linha por vez, espera-se encerrar seu trabalho, e só depois que ela tiver deixado a gira, chama-se outra linha. Todos os médiuns trabalham com Caboclos, depois com Baianos, por exemplo.
Especifica ­ são as giras de Abaluaê, Oriente, Ibeijada, Exús e Pomba Giras. No caso destas giras são necessários certos procedimentos para se isolar o trabalho. Isso pode ser feito com preces, cânticos especiais ou até mesmo em dias especiais após imantações.
gira de Exú 
é uma gira difícil de ser trabalhada pois muitos deturpam a sua finalidade e o modo de trabalho de tais entidades. A falta de conhecimento leva muitos a acreditarem que se trata do "diabo". Mal sabem que o diabo é o mal, o orgulho, a vaidade, a discriminação e a preguiça que alguns carregam consigo.
Deve-se cantar 7 curimbas para Ogum que sempre abre e fecha esta gira - não é obrigatória a incorporação de Ogum. A energia de Ogum é responsável pelo equilíbrio dos espíritos desta faixa de evolução. Os Exús e Pomba Giras não precisam usar bebidas a não ser para trabalhos específicos e a quantidade é absurdamente pequena . Eles recebem sua libação na tronqueira.
Os Exús e Pomba Giras são entidades evoluídas, embora estejam na base do desenvolvimento espiritual, por isso não aceitamos, de forma alguma, aqueles que fazem gestos obscenos, falam palavrões e dão gargalhadas espalhafatosas ou mesmo que utilizam roupas extravagantes já que todas as outras entidades trabalham com os médiuns vestidos de branco. Isso tudo é teatro, brilho, fantasia não tem nenhuma importância espiritual. Tais entidades são de muito respeito e muita luz, porém humildes e muito próximas da consciência terrena, deixam seus médiuns a vontade até mesmo em suas "palhaçadas". Médium evoluído, Exú em evolução, valendo também o inverso.
Estas entidades defendem nosso campo anímico (ligação matéria/espírito) para que Oxalá possa continuar conveccionando a vida. Vemos assim que elas têm uma importante função no plano espiritual.
gira de Ibeijada 
também é uma das giras difíceis de um terreiro. Após a "abertura" normal da gira e com todos os fundamentos preparados para este trabalho puxa-se a falange das crianças que, por acaso, não são malcriadas apesar de serem alegres e brincalhonas. Muitos médiuns se aproveitam de tal situação e fazem arruaça, achando que com isso tornam autentica a sua incorporação.
Os Erês ou Cosmes (homenagem a São Cosme , entidade protetora das crianças segundo a Igreja Católica) podem brincar sem desrespeitar os princípios espirituais. Essas entidades são a sublimação das forças cósmicas e jamais devemos desafiá-las pensando que por "serem crianças" não tem muita força. A devoção a essa vibração pode nos salvar de situações difíceis.
Deve-se, sempre após uma gira de Ibeijada, chamar outra entidade para encerrar os trabalhos, pois as "crianças" limpam os consulentes e fazem os trabalhos, mas não descarregam a negatividade.
gira de Abaluaê 
deve ser isolada das demais, através de preces específicas que devem ser rezadas antes e depois desta gira. Nessas preces deve-se buscar o fortalecimento mental dos médiuns da corrente e projetar energia equilibrando-os para conseguirem assimilar esta vibração que, por ser uma energia de sublimação (Nanã = reação, Omulú = ação) chega na terra de forma triangular , ocupando um espaço maior que as demais vibrações, portanto formando um campo magnético amplo em que o médium pode não conseguir permanecer.
gira do Oriente 
deve começar a ser preparada uma semana antes do dia propriamente dito. Ela deve ser aberta pelo Zelador com preces e, durante a semana, devem ser invocadas todas as entidades que irão trabalhar, mantendo-se iluminados os respectivos pontos de firmeza. No dia da gira só deverão participar os médiuns que se mantiveram em harmonia com os fundamentos do terreiro naquela semana. Nestas giras geralmente recebe-se espíritos de muita sabedoria que vem a terra para nos ensinar ou passar mensagens importantes. Não devemos confundir esta gira com a festa dos ciganos. Agira do Oriente trabalha com os espíritos mentores de diversas crenças e culturas orientais.

GIRA BLOQUEADA
Assim chamamos a dificuldade que o médium de incorporação parcial tem de penetrar na faixa vibratória de certos consulentes. Quando isso ocorre o médium não está, necessariamente, falhando ou sem a sua entidade.
Os motivos podem ser:
a) consulente carregado de energia negativa. O consulente fica envolvido dentro de uma redoma.
b) consulente que procura a tenda por simples curiosidade ou para testar as entidades.
c) o consulente é médium ou mesmo Zelador. Já tem sua "coroa" feita e sua próprias entidades fecham a sua faixa vibratória para resguardá-lo.
Nos casos "a" e "b" o médium não deve se deixar perturbar e também não deve tentar romper o bloqueio, pois além de lhe causar grande perda de ectoplasma isso pode fazer com que caia em descredito. O correto é recomendar ao consulente um limpeza espiritual através de banhos de descarrego, imantações e preces e pedir-lhe que retorne para nova consulta.
É importante salientar que as giras de passe não são "consultório sentimental" ou lugar de "conversa fiada, muito menos fábrica de milagres. As pessoas devem ser orientadas para que não desgastem os médiuns contando toda a sua vida. A entidade irá perguntar somente o necessário, não ficará tentando fazer adivinhações.
O Consulente deve ser instruído a manter-se concentrado em seus objetivos para que toda a força do terreiro seja empenhada em fazer a ciclagem espiritual do mesmo. É desta forma que se consegue o que se procura e não com trabalhos direcionados a terceiros. Ninguém tem o direito de interferir no caminho espiritual de outra pessoa a não ser que esta peça. Não devemos esquecer do "livre arbítrio" e principalmente de que "nos tornamos responsáveis por tudo que cativamos"
No caso "c" deve-se somente saudar a "coroa" do consulente e realizar o passe.

PROCEDIMENTO DENTRO DA GIRA

Após o devido preparo espiritual com banhos e imantações e depois de receber as orientações preliminares (aulas) o médium deve seguir o seguinte esquema dentro das giras:
Reflexão -
Quando médium ao adentrar a gira deve refletir sobre sua vida nos dias que antecederam ao trabalho, procurando observar seus pontos fracos, seus erros e acertos. Deverá agradecer a Pai Oxalá a chance de estar novamente a seu serviço.
Concentração - 
Após a reflexão, o médium deve se desligar de tudo que o cerca. Deve fixar seu pensamento num ponto que lhe seja positivo, que lhe cause bem estar, a fim de que sua mente fique livre para receber todas as vibrações e de que seu corpo possa absorver completamente as imantações do ambiente.
Desde a sua entrada no terreiro até o inicio da gira, o médium deve manter-se em silencio absoluto, respirando pausadamente, aguardando a chegada dos demais companheiros.
Quando o médium entra no terreiro ele pode tocar o chão com a mão direita e em seguida benzer-se com o sinal da cruz, saudando as entidades da casa. Não é obrigatório, se não vier do coração.
Após o início da gira chegará o momento de "bater cabeça". O que isso significa? Como fazê-lo?
Cada médium poderá ter seu "pano-de-cabeça", o qual deverá ser estendido no chão, diante do Pejí, e, ao som de cântico correspondente, deverá tocar o chão, sobre o pano, com a testa (Salve meu Pai Oxalá). Depois deverá tocar o chão com o lado direito da fronte saudando o Orixá masculino do terreiro (quando já souber seu Pai de Cabeça, ele é quem deverá ser saudado). A seguir deverá tocar o chão com o lado esquerdo da fronte saudando o Orixá feminino do terreiro (quando já souber sua Mãe de Cabeça deverá saudá-la).
A seguir será feita a defumação do ambiente quando, então, os médiuns que já usam as guias, deveram colocá-las no pescoço após imantá-las com a defumação.
DEFUMAÇÃO ­ 
A produção de aroma se faz pela mistura e aquecimento de várias ervas e essências e tem a finalidade de atrair vibrações e romper o campo magnético do ambiente que será utilizado para os trabalhos.
A cada material cabe atrair um tipo de vibração: boa ou má. Por exemplo: as ervas favorecem as boas vibrações e as espalham pelo ar, já o carvão atrai as más vibrações, porém as retém. Esse carvão será deixado na tronqueira até o final da gira e depois será jogado fora pois a negatividade já terá sido absorvida pelos Exús. (Veja Defumação)

Considerações Gerais

Começamos com o terreiro. Na frente, no portão de entrada normalmente tem uma pequena casa. Nós a chamamos de Tronqueira. Lá dentro tem uma imagem do Sr. Tranca-Ruas, o poderoso Exú protetor do terreiro. É a nossa guarda.
O Terreiro é dividido em duas partes: a da assistência e o terreiro onde se desenvolve a "engira". Daqui para a frente simplesmente "gira". Em todo terreiro costuma-se haver um quadrado ou um centro de vibração, onde está enterrada a segurança de toda a casa. É um buraco que contém as armas do Orixá Chefe. Dali, emanando todo o axé da casa. Cria-se, então, um campo vibratório de muita força.
Em alguns terreiros existe hierarquia. Além do dirigente, existem as figuras da Mãe-Pequena e do Pai-Pequeno. Após os capitães de terreiro e dos ogans (atabaqueiros). Todos os membros da corrente devem prestar-lhes obediência e respeito e, ao entrar no terreiro, devem reverenciar-lhes, ritual rigorosamente observado pela religião umbandista. Todos carregam guias diferenciadas dos membros da corrente.
O médium deve ter sempre a consciência de nunca comer carne no dia em que irá trabalhar. Carne proveniente de animais de sangue quente podem conter energias contrárias às necessidades do trabalho que será desenvolvido. Além disso, o sangue contêm muita energia que, se usada por espíritos de pouca ou nenhuma luz, pode atrapalhar consideravelmente o bom andamento do trabalho.
Considerando também que na evolução do reino animal, usar-se-á para sua própria alimentação animais que estejam distantes do grau evolutivo do ser humano, ou seja, recomenda-se o uso de peixes para se alimentar evitando animais mais evoluídos afastando-se das energias inerentes a animais sacrificados para nossa alimentação e que nos sejam "próximos".
Como o dia de trabalho é sagrado, deve-se evitar a todo custo pensamentos pecaminosos, xingamentos, sentimentos de ódio de maneira geral, sexo, frequentar lugares que sugiram alguma ligação com energias que possam ser prejudiciais ao trabalho.
Não lavar a cabeça mas sim o restante do corpo. Não deve também cortar seu cabelo ou qualquer outra ação que envolva a manipulação de seu chakra coronário.
(Obs.: Banho de descarga com as ervas do seu Orixá).

Chegando no terreiro...

Saudar a(s) Tronqueira(s):
Saudar Seu Tranca Ruas.
Pedir proteção, pedir ajuda nos trabalhos.
Pedir para limpar seu corpo de larvas e miasmas astrais.
Pedir licença para entrar no terreiro. Considere sempre que o chão do terreiro é um solo sagrado e é onde serão desenvolvidos todos os trabalhos. Portanto, faz-se necessário pedir licença para pisá-lo.
Para pedir licença para pisar no terreiro deve-se tocar o chão com o dedo médio, tocando-o 3 vezes, descrevendo um triângulo, (tríade Crianças, Caboclos e Pretos-Velhos) e em seguida tocar a fronte, o lóbulo parietal e lóbulo occipital (tríade matéria, mente e espírito) solicitando-lhes que nos ajude a manter o fortalecimento e a harmonia destes planos.
As Crianças significam a infância, com sua pureza e inocência.
Os Caboclos significam a mocidade com sua energia.
Os Pretos Velhos significam a velhice com sua humildade e experiência.
Saudar Oxalá.
Saudar seu Orixá de cabeça. Se não souber ainda qual é seu Orixá de cabeça, bastará saudar Oxalá.
Em terreiros que tenham Ogan deve-se saudar o Ogan Chefe. O Ogan é o chefe dos atabaques.
Em terreiro que mantém hierarquia com capitães, deve-se cumprimentar os Capitães do terreiro obedecendo a hierarquia entre eles, ou seja, o 1º capitão a ser cumprimentado deve ser sempre o capitão mais novo a ocupar esta posição, em seguida cumprimentar o segundo e assim consecutivamente até o Capitão mais antigo do terreiro.
Em terreiros que tem pai-pequeno/mãe-pequena deve-se cumprimentá-los. É importante observar que a Umbanda não tem cargos hierárquicos. Muitas vezes esses cargos e definições dentro do terreiro são características advindas do Candomblé.
Cumprimentar o dirigente do terreiro.
Ao som do Hino da Umbanda, a corrente entra no terreiro, cantando alegres, dispostos, de branco, com suas guias e banho de ervas previamente tomado. Após, inicia-se a defumação em todos os presentes. Vale aqui dizer que todo o ritual tem que, obrigatoriamente, ser feito com pontos cantados. Após a defumação, vem o bate-cabeça, oportunidade dos membros da corrente. Os que têm hierarquia já o fizeram no início. Em seguida a saudação aos Anjos da Guarda. Louva-se aos Orixás e aos espíritos que trabalham através dos cavalos (médiuns) no terreiro. Em seguida pede-se a proteção do Sr. Ogum de Ronda. Saudação à Quimbanda e ao Sr. Tranca-Ruas não podem faltar. Feito este ritual é que começam as incorporações.

FUNDAMENTOS DO RITUAL
Hino de Umbanda

É um mantra de louvação à Umbanda.
Os povos em suas liturgias religiosas, desde os tempos imemoriais, invocam suas divindades, não só pelo vocábulo, como também, pela palavra cantada, através de hinos, ladainhas, mantras, cânticos, salmos e pontos cantados.
Defumação

A defumação harmoniza e aumenta o teor das vibrações psíquicas, produzindo condições de recepção e inspiração nos planos físico e espiritual.
Além de influenciar em nossas vibrações psíquicas, as ervas utilizadas na defumação são poderosos agentes de limpeza vibratória, que tornam o ambiente mais agradável e leve. Ao queimarmos as ervas, liberamos em alguns minutos de defumação todo o poder energético aglutinado em meses ou anos no solo da terra, absorção de nutrientes dos raios de sol, da lua, do ar, além dos próprios elementos constituitivos das ervas. Deste modo, projetam-se forças capazes de desagregar miasmas astrais que dominam a maioria dos ambientes humanos, produto de baixa qualidade de pensamentos e desejos, como raiva, vingança, orgulho, mágoa ,etc.
O que fazer nesta hora? Pedindo pela purificação do Terreiro dos médiuns e assistência fechando o nosso corpo e mentalizar os guias, anjo da guarda, pedindo que essas energias nocivas se dissipem.
Bate Cabeça

Neste momento os filhos estão saudando seus Orixás de cabeça e pedindo licença aos mentores espirituais da casa para iniciar os trabalhos.
Anjo da Guarda

Neste momento de louvação ao nosso Anjo de Guarda, devemos pedir sua proteção e harmonia.
Prece de Abertura

É o momento aonde elevamos os nossos pensamentos e pedimos por nós, pelo bom andamento dos trabalhos espirituais, por parentes e amigos encarnados ou desencarnados, deixando toda as mágoas e maus pensamentos, tudo que é de ruim do lado de fora, para que possamos formar uma corrente com bastante solidez que possa combater qualquer força contraria sem romper um elo desta corrente.
Abertura de Gira

Neste momento o dirigente puxa o ponto de abertura de gira (Eu abro a nossa gira com Deus e Nossa Senhora...), é um momento de muita concentração, é quando ele recebe a permissão dos guias espirituais para dar início ao trabalho.
Deus Salve a Pemba, Salve a Toalha e Salve Nosso Congá

Pemba: a caneta dos guias, objeto sagrado na Umbanda, é através dela que se dá a grafia dos espíritos.
Toalha: é onde sauda-se o Orixá, pano de cabeça imantado através do ritual do amaci.
Congá: lugar sagrado aonde estão representados os Orixás e guias que são cultuados na Umbanda.
Salve a Engoma

Engoma: Atabaques, instrumento sagrado e de grande poder vibratório.
Neste momento do trabalho são tocados ritmos de imantação e fixação de energia.
Os atabaques são responsáveis pela harmonia do terreiro através do ritmo.
Salve as Setes linhas da Umbanda

Saudação aos naturais: espíritos que habitam a natureza, que nunca tiveram encarnações, por isso são puros.
Cinco são os reinos naturais: mineral, vegetal, aquático, aéreo, telúrico.
Salve as Crianças

Preparo da firmeza do terreiro. S ão responsáveis pela nossa alimentação de força.
Salve as Entidades da Casa

È o momento em que se sauda todas as entidades que cuidam da casa e os mentores espirituais do trabalho.
Saravá Exú

Normalmente sauda-se o Sr. Tranca Ruas, porque ele é quem recebe a responsabilidade de cuidar de todas as tronqueiras dos terreiros de Umbanda, é ele que abre o terreiro e fecha a rua e no fim da gira fecha o terreiro e abre a rua.
Pode-se, neste momento, saudar algum outro Exú que esteja com a responsabilidade contígua de guardar a casa e a gira.
Saravá Ogum de Ronda


Saravá (Orixá)

É cantado ponto de firmeza de linha do Orixá regente do dirigente.


 Elementais

Elementais são entidades espirituais relacionadas com os elementos da natureza.
Lá, no meio ao elementos, desempenham tarefas muito importantes. Na verdade, não seria exagero dizer inclusive que são essenciais à totalidade da vida no mundo.
Através dos elementais e de sua ação direta nos elementos é que chegam às mãos do homem as ervas, flores e frutos, bem como o oxigênio, a água e tudo o mais que a ciência denomina como sendo forças ou produtos naturais.
Na natureza esses seres se agrupam, segundo suas afinidades formando uma espécie de famílias.
Essas famílias elementais, como as denominamos, estão profundamente ligadas a este ou aquele elemento: fogo, terra, água e ar, conforme a especialidade, a natureza e a procedência de cada uma delas.
Elementais não tiveram nenhuma encarnação como as conhecemos como humanas. Eles procedem de uma larga experiência evolutiva nos chamados reinos inferiores e, como princípios inteligentes, estão a caminho de uma humanização no futuro, que somente Deus conhece. Hoje, eles desempenham um papel muito importante junto à natureza como um todo, inclusive auxiliando os encarnados nas reuniões mediúnicas e os desencarnados sob cuja ordem servem.
Salamandra, Duende, Saci, Fara, Sereia, Tritão, Ondina, Ninfa, Fada, Lutin, Brolunie, Pixy, Follet, Leprechaun, Elfo, Tomtimtot, Cavernícolas, Gnomos, Trolls, Silfos, Sílfides, Homúnculos..., estes são alguns dos seres que cumprem a tarefa de realizar a evolução da vida e da forma do nosso planeta.
Falar cabalisticamente dos silfos é falar das almas, dos espíritos do ar, pois representam a potência ativa deste elemento, ordenado e provocando suas manifestações. Da mesma forma as ondinas, os gnomos e as salamandras, cada um em seu meio respectivo. São almas gerando, ordenando e dirigindo suas manifestações peculiares, e trabalham dentro de uma linha evolutiva diversa da dos seres humanos. Podem ser percebidas pelo homem em certos estados de consciência.
A linha a que pertencem é chamada de "evolução dévica", situando-se na escala angelical com as outras sete linhas menores, as quais cabe realizar a evolução da vida e da forma do nosso planeta. Acima dos elementais, devas maiores, estão os anjos e os arcanjos. Na escala ascendente da dimensão evolucionária, até que sejam espíritos da natureza (Oxalá, Ogum, Oxóssi, Xangô, Yemanjá, Iansã e Exú).
Os elementais são constituídos de luz, um tênue material autoluminoso e suas formas são semelhantes à humana. Por serem assim formados, as variações de consciência ou emoções produzem mudanças de sua coloração e até na própria forma. Eles podem usar duas formas distintas, ou seja, seu corpo astral e o veículo etéreo temporariamente materializado. A forma astral consiste de uma aura esférica multicolorida, energética e o veículo etéreo permite um senso de individualidade.
Nas épocas de germinação, crescimento e desenvolvimento dos vegetais, a vitalidade e a atividade desses seres aumentam pelo seu contato com o mundo físico, aliás, é durante esse período que eles se tornam mais visíveis, dançam, brincam e, de certa forma, ligando-se aos sensitivos e encontrando maior facilidade para se comunicar.
Pode-se citá-los conforme seus respectivos meios. Nas florestas, comandadas por Oxóssi, temos as dríades, lindas de cabelos compridos e luminosos, trabalhando diretamente nas árvores; as fadas muito belas e, com suas fascinantes evoluções, manipulam a clorofila das plantas, estabelecendo a multiplicidade de matizes das flores e fragrâncias que elas exalam, sendo que as fadas mais evoluídas agem transformando, combinando e misturando não apenas coloração e fragrância, mas também a forma de cada pétala ou broto que nasce nos campos, prados, vales, pomares, jardins e grutas; os elfos, que voam pelos campos, estão associados à vida das células da relva a outras plantas, tomando parte na sua formação física; os homúnculos das árvores trabalham dentro do duplo etérico das árvores.
Trabalhando na terra temos os duendes e os gnomos cuidando da sua fecundidade, das pedras e metais preciosos, sendo que alguns deles evoluem tornando-se anjos que presidem áreas de crescentes dimensões, modelando as formas mais densas, puramente sólidas da natureza. Pertencente ao elemento água, as ondinas nunca são encontradas longe dos oceanos, rios, lagos ou córregos; sua forma é feminina, não tem asas, seus movimentos são graciosos a sua beleza arrebatadora; a cascata é o lugar preferido das ondinas e é onde elas se divertem aos bandos, sendo também onde a Umbanda trabalha na purificação de seus adeptos. Os silfos pertencem à linha evolucionária, presidida pelo Senhor do Ar e, como as fadas, também apresentam asas que se estendem por todos os seus corpos etéricos voam, andam, fluem forças através de suas auras, em pequenos grupos com cores a matizes vibrando entre elas, ou acima delas, movimentando-se com extrema rapidez. As salamandras são espíritos do fogo e se apresentam como correntes de energia ígnea que fluem, precipitam-se. Não se amoldando jamais as figuras e posições humanas; de acordo com a vontade do supremo senhor do fogo, fonte da existência, os anjos do fogo vivem e dirigem a ação das energias ígneas solares.
Os elementais são espíritos da natureza, funcionam como agentes cósmicos que não se desenvolvem em seres humanos e que tem como tarefa primordial divinizar o elemento vital, num campo onde não existe a energia emocional.
A Umbanda utiliza, no contato com os elementais, o meio de reaproximar-se novamente da natureza, tomando como base e beleza do trabalho harmonioso dos seres que elaboram o alimento que vivifica a inteligência nascente.

ELEMENTOS DA TRANSMUTAÇÃO

Manipulando os quatro elementos naturais (ar, água, terra e fogo), a Umbanda transmuta os valores energéticos universais, de onde extrai a força mágica que lhe permite interferir na realidade concreta.
Isso porque, dominando o ponto neutro dos fluxos a refluxos da onda modulada que, seu estado mais sutil, é a própria alma, ela promove o equilíbrio do ser humano com a natureza.

1. ELEMENTO - AR

O ar é um elemento da natureza considerado ativo masculino. Em geral é considerado como o primeiro dos elementos. Possui natureza dupla. Está essencialmente relacionado com três conjuntos de idéias: o respiro criativo da vida, a palavra criadora, o vento como ar dinamizado, com a idéia de criação; e finalmente, o próprio espaço, como meio onde se produzem os movimentos e de onde emergem os processos de criação e desenvolvimento da vida.
No campo humano, o ar está premente nos presentes, purificando e vitalizando o sangue que conduz o elemento vital ou agente mágico Universal. Ele é ainda o hálito que respiramos e que se acha simbolizado nas fumaças nos rituais de Umbanda.
A força mágica da fumaça reside no fato dela representar o ato de libertação da forma com uma imediata dissolução do ar, em forma espiralada. Isso permite ao elemento ar atuar como intermediário entre o mundo da forma e o mundo espiritual envolvente e invisível, tornando assim um agente mágico capaz de transformar em resultado eficaz a intenção com que a fumaça é libertada para dissolver-se no ar.
Portanto, pode-se explicar o poder da magia pela sua própria condição de se fortalecer pela transmutação e pelo retorno à plenitude. Uma vez fortalecida por sua identificação com o global. A intenção do ato mágico vai refletir-se como retorno sobre o mundo formal e alcançar o objetivo mágico com eficácia.
Está relacionado na umbanda pela energia que emana nos trabalhos, onde as entidades usam a fumaça com seus cachimbos, palheiro, cigarros e charutos. (quase todas as linhas)

2. ELEMENTO - ÁGUA

A água é um alimento da natureza considerado passivo feminino. O conceito da água estende-se de maneira geral a toda e matéria em estado líquido. Símbolo universal do principio feminino, das emoções e do inconsciente, de todas as substâncias, a água é a de mais complexa interpretação. Este conceito está sempre ligado aos conceitos de fertilização, de materialidade e de geração. A água consiste num fluído denso e numa essência potencial de natureza fluídica.
A água se manifesta de modo bem visível no mundo da forma e seu valor é incontestável. Em nosso planeta a água segue um ciclo de transformação.
Nos rituais de Umbanda, a água é considerada com os seus valores de cada etapa do ciclo das águas. Assim cada etapa está ligada a um determinado Orixá ou força da natureza, todas de origem feminina.
A água do mar, salgada, relaciona-se ao Orixá Yemanjá. O sal sempre teve importância e valor mágico devido a sua propriedade de conservar e evitar a putrefação e, como símbolo, acompanha a água. Sua presença é sempre marcante nas cerimônias do exorcismo. Por isso, o mar se investe da propriedade de receber os detritos físicos a espirituais, bem como objetos de trabalhos feitos. Colocar objetos no mar significa remetê-los ao caos primordial representado pelas águas marinhas.
A água doce está ligada ao Orixá Oxum e representa o amor, a bondade, a doçura, a beleza e a riqueza da vida material e espiritual. Serve como elemento condutor da energia vibratória, como agente mágico que religa o ser humano a Deus pelo batismo. No corpo humano, aliás, ela se manifesta como elemento líquido que representa cerca de 70% do volume do corpo.
Na magia, ela representa ainda o caos diferenciado, a essência divina não formalizada. É representada graficamente por três linhas paralelas horizontais e onduladas, simbolizando as ondas do mar.
Relaciona-se com os batismos, banhos de ervas a descarregos com água doce ou salgada de fontes ou de chuvas. Nos pontos das entidades que encontramos ondas, estas estão relacionadas com a água.

3. ELEMENTO - TERRA

A terra é um elemento da natureza considerado passivo e feminino. Tem duas partes essenciais: a inferior fina, terrena, imóvel e a superior rarefeita, móvel e virtual.
Este elemento se manifesta da forma sólida e a ele é atribuída a propriedade de receber descargas etéreas e materiais.
Elemento mágico de transformação, a terra mantém guardados, em seu interior, os segredos da purificação pela transformação, agindo como filtro magnético que retém a impureza e liberta a pureza. Todos os minerais pertencem ao elemento terra e são encontrados nos mais diversos tipos, por isso geram espontaneamente uma energia tão forte que o simples contato ou aproximação dos outros seres os envolve no seu campo magnético e os domina.
Na Umbanda o elemento terra representa a energia capaz de aliviar a pessoa das cargas dirigidas por alguém ou por alguma coisa. No meio da terra está o mistério da vida e da morte, onde a semente adquire a força vital para nascer e a transformação do corpo se processa na decomposição ou simplesmente onde se morre. A sua capacidade a de atração e transformação; como exemplo, temos a pedra que é do alimento terra e que representa o símbolo da unidade, da durabilidade e da força estática. A terra representa também a solidificação do ritmo criador, que é o contrário do ritmo biológico, pois este é submetido às leis de mudança, decadência e morte.
No corpo humano está representada pelos sais minerais, que fortificam o corpo e o agente vital. Sua simbologia gráfica é a cruz, que é o signo de sua crucificação e do homem.
Relaciona-se com vários trabalhos arriados a pedidos das entidades e é simbolizado pela cruz existente em seus pontos.

4. ELEMENTO - FOGO

O fogo é um elemento da natureza considerado ativo e masculino. Dos quatro elementos é o que mais constantemente se acha associado às religiões. É considerado o símbolo da própria alma e vida humana. É ao mesmo tempo visível e invisível - uma flama etérea e espiritual que se manifesta através de uma flama substancial e material.
Esotericamente, é a representação ou reflexo mais perfeito da "chama una", o princípio divino que é por sua vez, e como conceito, o mais alto símbolo da toda a humanidade. O fogo representa a vida e a morte, a origem e o fim de todas as coisas. Como sinônimo de vida o fogo tem muitos aspectos: pode ser encontrado tanto no nível da paixão animal e do erotismo (O fogo da paixão), como no nível dos mais ingentes esforços espirituais. Ele alcança e transcende o plano do bem (calor e energia vital) e o plano do mal (destruição e conflito), tendo a função de purificador supremo, como no caso de cremações ritualísticas de cadáveres.
A Umbanda considera, dentre os quatro elementos, que o fogo é mais enigmático e surpreendente, pois sua energia é extremamente poderosa. A essência ígnea não se mostra com tanta evidência como ocorre nos outros três elementos, pois o mundo visível o fogo só se mostra em sua forma luminígena. Apenas esta linguagem é comumente chamada de fogo.
Pela mística, o fogo é um alimento com duração na potência. Em outras palavras, pode-se dizer que ele pré-existe às suas manifestações nas modalidades de calor, chama e luz; constata-se que há modalidades sutis de manifestação do fogo, cujas percepções se dão através das emoções e de imagens anêmicas. Além disso o fogo, enquanto símbolo, tem enorme amplitude: significa divino, energia motora cósmica, energia sexual (sentido este bastante nítido no sincretismo fogo-serpente, a força latente responsável pela atividade sexual e pela consciência superior); a afetividade (compreendendo a ternura e a agressão). O fogo da vela simboliza a ligação matéria-espírito, homem-Deus. Seu símbolo gráfico é o corisco, ou o fogo que vem do alto, do céu ou de Deus.
Relaciona-se com a chama da vela.

 Eguns & Quiúmbas

QUEM SÃO?

Eguns nada mais são do que os espíritos que já desencarnaram, e os Quiúmbas são exatamente a mesma coisa. Apenas se dá entre eles uma diferença de evolução.
Senão vejamos:
Eguns, são todos os que desencarnaram, tiveram vida humana, em contraposição aos Orixás que são forças da natureza. Caboclos, Pretos-Velhos, Crianças e Exús, são Eguns. (Na Umbanda assim como no Candomblé, Exú é considerado como Orixá, sendo reverenciado e cultuado desta forma).
Quiúmbas são Eguns ainda muito atrasados na escala de evolução espiritual (o que não quer dizer que não sejam astutos), que são considerados negativos e que por vezes, se fazem passar por outras entidades, normalmente Exús, trazendo inclusive um ponto de vista muito negativo para estas entidades, os Exús, por eles mistificados.
É sabido que o termo evolução é extremamente relativo e dentro de uma mesma qualidade de entidades poderá variar muito o grau de evolução entre cada um deles. O que queremos dizer é que entre os Caboclos, assim como entre os Pretos-Velhos e outras entidades, sempre haverá um que esteja um pouco acima, e um outro um pouco abaixo no nível de evolução. O certo, no entanto, é que estas entidades, Caboclos, Pretos-Velhos, Crianças, Exús e algumas outras, já chegaram a um nível de evolução tal que os permitem diferenciar o certo do errado e procurarem humildemente ajuda e colaboração das entidades de níveis mais altos, no sentido de auxiliar aos filhos que os procuram, nos momentos em que seus conhecimentos, permissão ou capacidade são impotentes para a ajuda.
Normalmente se ouve:
" - Você está com o encosto de um egun muito perigoso!"
" - Você precisa fazer uma obrigação para despachar este egun que está complicando sua vida!"
Isso realmente pode acontecer, pois como já dissemos, egun é todo espírito desencarnado. E pode acontecer até, que por ignorância do espírito (egun), ele possa estar muito próximo, principalmente de seus entes queridos quando em vida, tumultuando a vida deles, principalmente pela diferença de vibração de suas energias. Este egun, precisa certamente ser esclarecido e afastado. Várias doutrinas se ocupam deste mister de maneiras diferentes, comprovando que é necessário que os níveis de vida mantenham suas independências: o encarnado e o desencarnado.
Nota-se a diferença então entre os eguns, Entidades e quiúmbas. Na realidade egun é a qualificação de todo e qualquer espírito desencarnado. O seu nível de evolução é que o especificará!
Quando se refere aos espíritos vampirizadores, aos incitadores ao vício ou àqueles que se aproximam de nós sempre para o mal, os quais são comprados por quem tem a alma maculada pela maldade, para nos impor males ou feitiços, esses serão certamente os quiúmbas, mas numa generalização muito comum, sempre nos referimos a eles como eguns.
E até pela vaidade e muitas vezes pela ignorância, não admitimos que possamos estar sendo mediunizados por um egun, qual seja, um Caboclo, um Preto-Velho ou mesmo um Exú, para um trabalho de caridade.
Desmistifiquemos então o conceito de egun. E tentemos de todas as maneiras, pela caridade, pela fé, pela oração e pelo trabalho espiritual, elevarmos cada vez mais nossos eguns de fé para que, pelo trabalho deles, possam ser cada vez mais atraídos para os caminhos de luz, aqueles eguns, os quiúmbas, que ainda se encontram nos lamaçais da espiritualidade.

O CULTO DOS EGUNS NO CANDOMBLÉ

Os negros iorubanos originários da Nigéria trouxeram para o Brasil o culto dos seus ancestrais chamados Eguns ou Egunguns. Em Itaparica (BA), duas sociedades perpetuam essa tradição religiosa. (Revista Planeta n.º 162 - março 86)
Os cultos de origem africana chegaram ao Brasil juntamente com os escravos. Os iorubanos - um dos grupos étnicos da Nigéria, resultado de vários agrupamentos tribais, tais como Keto, Oyó, Ijexá, Ifan e Ifé, de forte tradição, principalmente religiosa - nos enriqueceram com o culto de divindades denominadas genericamente de orixás.
(1 - Por motivos gráficos e para facilitar a leitura, os termos em língua yorubá foram aportuguesados. Ex.: orisá = orixá.)
Esses negros iorubanos não apenas adoram e cultuam suas divindades, mas também seus ancestrais, principalmente os masculinos. A morte não é o ponto final da vida para o iorubano, pois ele acredita na reencarnação (àtúnwa), ou seja, a pessoa renasce no mesmo seio familiar ao qual pertencia; ela revive em um dos seus descendentes. A reencarnação acontece para ambos os sexos; é o fato terrível e angustiante para eles não reencarnar.
Os mortos do sexo feminino recebem o nome de Iami Agbá (minha mãe anciã), mas não são cultuados individualmente. Sua energia como ancestral é aglutinada de forma coletiva e representada por Iami Oxorongá, chamada também de Iá Nlá, a grande mãe.
Esta imensa massa energética que representa o poder de ancestralidade coletiva feminina é cultuada pelas "Sociedades Geledê", compostas exclusivamente por mulheres, e somente elas detêm e manipulam este perigoso poder. O medo da ira de Iami nas comunidades é tão grande que, nos festivais anuais na Nigéria em louvor ao poder feminino ancestral, os homens se vestem de mulher e usam máscaras com características femininas, dançam para acalmar a ira e manter, entre outras coisas, a harmonia entre o poder masculino e o feminino.
Além da Sociedade Geledê, existe também na Nigéria a Sociedade Oro. Este é o nome dado ao culto coletivo dos mortos masculinos quando não individualizados. Oro é uma divindade tal qual Iami Oxorongá, sendo considerado o representante geral dos antepassados masculinos e cultuado somente por homens. Tanto Iami quanto Oro são manifestações de culto aos mortos. São invisíveis e representam a coletividade, mas o poder de Iami é maior e, portanto, mais controlado, inclusive, pela Sociedade Oro.
Outra forma, e mais importante de culto aos ancestrais masculinos é elaborada pelas "Sociedades Egungum". Estas têm como finalidade celebrar ritos a homens que foram figuras destacadas em suas sociedades ou comunidades quando vivos, para que eles continuem presentes entre seus descendentes de forma privilegiada, mantendo na morte a sua individualidade. Esse mortos surgem de forma visível mas camuflada, a verdadeira resposta religiosa da vida pós-morte, denominada Egum ou Egungum. Somente os mortos do sexo masculino fazem aparições, pois só os homens possuem ou mantém a individualidade; às mulheres é negado este privilégio, assim como o de participar diretamente do culto.
Esses Eguns são cultuados de forma adequada e específica por sua sociedade, em locais e templos com sacerdotes diferentes dos dos orixás. Embora todos os sistemas de sociedade que conhecemos sejam diferentes, o conjunto forma uma só religião: a iorubana.
No Brasil existem duas dessas sociedades de Egungum, cujo tronco comum remonta ao tempo da escravatura: Ilê Agboulá, a mais antiga, em Ponta de Areia, e uma mais recente e ramificação da primeira, o Ilê Oyá, ambas em Itaparica, Bahia (veja quadro histórico).
O Egum é a morte que volta à terra em forma espiritual e visível aos olhos dos vivos. Ele "nasce" através de ritos que sua comunidade elabora e pelas mãos dos Ojé (sacerdotes) munidos de um instrumento invocatório, um bastão chamado ixã, que, quando tocado na terra por três vezes e acompanhado de palavras e gestos rituais, faz com que a "morte se torne vida", e o Egungum ancestral individualizado está de novo "vivo".
A aparição dos Eguns é cercada de total mistério, diferente do culto aos orixás, em que o transe acontece durante as cerimônias públicas, perante olhares profanos, fiéis e iniciados. O Egungum simplesmente surge no salão, causando impacto visual e usando a surpresa como rito. Apresenta-se com uma forma corporal humana totalmente recoberta por uma roupa de tiras multicoloridas, que caem da parte superior da cabeça formando uma grande massa de panos, da qual não se vê nenhum vestígio do que é ou de quem está sob a roupa.
Fala com uma voz gutural inumana, rouca, ou às vezes aguda, metálica e estridente - característica de Egum, chamada de séègí ou sé, e que está relacionada com a voz do macaco marrom, chamado ijimerê na Nigéria (veja lendas de Oyá).
As tradições religiosas dizem que sob a roupa está somente a energia do ancestral; outras correntes já afirmam estar sob os panos algum mariwo (iniciado no culto de Egum) sob transe mediúnico. Mas, contradizendo a lei do culto, os mariwo não podem cair em transe, de qualquer tipo que seja. Pelo sim ou pelo não, Egum está entre os vivos, e não se pode negar sua presença, energética ou mediúnica, pois as roupas ali estão e isto é Egum.
A roupa do Egum - chamada de eku na Nigéria ou opá na Bahia -, ou o Egungum propriamente dito, é altamente sacra ou sacrossanta e, por dogma, nenhum humano pode tocá-la. Todos os mariwo usam o ixã para controlar a "morte", ali representada pelos Eguns. Eles e a assistência não devem tocar-se, pois, como é dito nas falas populares dessas comunidades, a pessoa que for tocada por Egum se tornará um "assombrado", e o perigo a rondará. Ela então deverá passar por vários ritos de purificação para afastar os perigos de doença ou, talvez, a própria morte.
Ora, o Egum é a materialização da morte sob as tiras de pano, e o contato, ainda que um simples esbarrão nessas tiras, é prejudicial. E mesmo os mais qualificados sacerdotes - como os ojé atokun, que invocamm, guiam e zelam por um ou mais Eguns - desempenham todas essas atribuições substituindo as mãos pelo ixã.
Os Egum-Agbá (ancião), também chamados de Babá-Egum (pai), são Eguns que já tiveram os seus ritos completos e permitem, por isso, que suas roupas sejam mais completas e suas vozes sejam liberadas para que eles possam conversar com os vivos. Os Apaaraká são Eguns mudos e suas roupas são as mais simples: não têm tiras e parecem um quadro de pano com duas telas, uma na frente e outra atrás. Esses Eguns ainda estão em processo de elaboração para alcançar o status de Babá; são traquinos e imprevisíveis, assustam e causam terror ao povo.
O eku dos Babá são divididos em três partes:
• o abalá, que é uma armação quadrada ou redonda, como se fosse um chapéu que cobre totalmente a extremidade superior do Babá, e da qual caem várias tiras de panos coloridas, formando uma espécie de franjas ao seu redor;
• o kafô, uma túnica de mangas que acabam em luvas, e pernas que acabam igualmente em sapatos; e
• o banté, que é uma tira de pano especial presa no kafô e individualmente decorada e que identifica o Babá.
O banté, que foi previamente preparado e impregnado de axé (força, poder, energia transmissível e acumulável), é usado pelo Babá quando está falando e abençoando os fiéis. Ele sacode na direção da pessoa e esta faz gestos com as mãos que simulam o ato de pegar algo, no caso o axé, e incorporá-lo. Ao contrário do toque na roupa, este ato é altamente benéfico.
Na Nigéria, os Agbá-Egum portam o mesmo tipo de roupa, mas com alguns apetrechos adicionais: uns usam sobre o alabá mascaras esculpidas em madeira chamadas erê egungum; outros, entre os alabá e o kafô, usam peles de animais; alguns Babá carregam na mão o opá iku e, às vezes, o ixã. Nestes casos, a ira dos Babás é representada por esses instrumentos litúrgicos.
Existem várias qualificações de Egum, como Babá e Apaaraká, conforme sus ritos, e entre os Agbá, conforme suas roupas, paramentos e maneira de se comportarem. As classificações, em verdade, são extensas.
Nas festas de Egungum, em Itaparica, o salão público não tem janelas, e, logo após os fiéis entrarem, a porta principal é fechada e somente aberta no final da cerimônia, quando o dia já está clareando. Os Eguns entram no salão através de uma porta secundária e exclusiva, único local de união com o mundo externo.
Os ancestrais são invocados e eles rondam os espaços físicos do terreiro. Vários amuxã (iniciados que portam o ixã) funcionam como guardas espalhados pelo terreiro e nos seus limites, para evitar que alguns Babá ou os perigosos Apaaraká que escapem aos olhos atentos dos ojés saiam do espaço delimitado e invadam as redondezas não protegidas.
Os Eguns são invocados numa outra construção sacra, perto mas separada do grande salão, chamada de ilê awo (casa do segredo), na Bahia, e igbo igbalé (bosque da floresta), na Nigéria. O ilê awo é dividido em uma ante-sala, onde somente os ojé podem entrar, e o lèsànyin ou ojê agbá entram.
Balé é o local onde estão os idiegungum, os assentamentos - estes são elementos litúrgicos que, associados, individualizam e identificam o Egum ali cultuado -, e o ojubô-babá, que é um buraco feito diretamente na terra, rodeado por vários ixã, os quais, de pé, delimitam o local.
Nos ojubô são colocadas oferendas de alimentos e sacrifícios de animais para o Egum a ser cultuado ou invocado. No ilê awo também está o assentamento da divindade Oyá na qualidade de Igbalé, ou seja, Oyá Igbalé - a única divindade feminina venerada e cultuada, simultaneamente, pelos adeptos e pelos próprios Eguns (veja Mitos Oyá-Egum).
No balé os ojê atokun vão invocar o Egum escolhido diretamente no assentamento, e é neste local que o awo (segredo) - o poder e o axé de Egum - nasce através do conjunto ojê-ixã/idi-ojubô. A roupa é preenchida e Egum se torna visível aos olhos humanos.
Após saírem do ilê awo, os Eguns são conduzidos pelos amuxã até a porta secundária do salão, entrando no local onde os fiéis os esperam, causando espanto e admiração, pois eles ali chegaram levados pelas vozes dos ojê, pelo som dos amuxã, brandindo os ixã pelo chão e aos gritos de saudação e repiques dos tambores dos alabê (tocadores e cantadores de Egum). O clima é realmente perfeito.
O espaço físico do salão é dividido entre sacro e profano. O sacro é a parte onde estão os tambores e seus alabê e várias cadeiras especiais previamente preparadas e escolhidas, nas quais os Eguns, após dançarem e cantarem, descansam por alguns momentos na companhia dos outros, sentados ou andando, mas sempre unidos, o maior tempo possível, com sua comunidade. Este é o objetivo principal do culto: unir os vivos com os mortos.
Nesta parte sacra, mulheres não podem entrar nem tocar nas cadeiras, pois o culto é totalmente restrito aos homens. Mas existem raras e privilegiadas mulheres que são exceção, como se fosse a própria Oyá; elas são geralmente iniciadas no culto dos orixás e possuem simultaneamente oiê (posto e cargo hierárquico) no culto de Egum - estas posições de grande relevância causam inveja à comunidade feminina de fiéis.
São estas mulheres que zelam pelo culto, fora dos mistérios, confeccionando as roupas, mantendo a ordem no salão, respondendo a todos os cânticos ou puxando alguns especiais, que somente elas têm o direito de cantar para os Babá. Antes de iniciar os rituais para Egum, elas fazem uma roda para dançar e cantar em louvor aos orixás; após esta saudação elas permanecem sentadas junto com as outras mulheres. Elas funcionam como elo de ligação entre os atokun e os Eguns ao transmitir suas mensagens aos fiéis. Elas conhecem todos os Babá, seu jeito e suas manias, e sabem como agradá-los(ver quadro: oiê femininos).
Este espaço sagrado é o mundo do Egum nos momentos de encontro com seus descendentes. Assistência está separada deste mundo pelos ixã que os amuxã colocam estrategicamente no chão, fazendo assim uma divisão simbólica e ritual dos espaços, separando a "morte" da "vida". É através do ixã que se evita o contato com o Egun: ele respeita totalmente o preceito, é o instrumento que o invoca e o controla. às vezes, os mariwo são obrigados a segurar o Egum com o ixã no seu peito, tal é a volúpia e a tendência natural de ele tentar ir ao encontro dos vivos, sendo preciso, vez ou outra, o próprio atokun ter de intervir rápida e rispidamente, pois é o ojê que por ele zela e o invoca, pelo qual ele tem grande respeito.
O espaço profano é dividido em dois lados: à esquerda ficam as mulheres e crianças e à direita, os homens. Após Babá entrar no salão, ele começa a cantar seus cânticos preferidos, porque cada Egum em vida pertencia a um determinado orixá. Como diz a religião, toda pessoa tem seu próprio orixá e esta característica é mantida pelo Egun.
Por exemplo: se alguém em vida pertencia a Xangô, quando morto e vindo com Egum, ele terá em suas vestes as características de Xangô, puxando pelas cores vermelha e branca. Portará um oxê (machado de lâmina dupla), que é sua insígnia; pedirá aos alabês que toquem o alujá, que também é o ritmo preferido de Xangô, e dançará ao som dos tambores e das palmas entusiastas e excitantemente marcadas pelo oiê femininos, que também responderão aos cânticos e exigirão a mesma animação das outras pessoas ali presentes.
Babá também dançará e cantará suas próprias músicas, após ter louvado a todos e ser bastante reverenciado. Ele conversará com os fiéis, falará em um possível iorubá arcaico e seu atokun funcionará como tradutor. Babá-Egum começará perguntando pelos seus fiéis mais freqüentes, principalmente pelos oiê femininos; depois, pelos outros e finalmente será apresentado às pessoas que ali chegaram pela primeira vez.
Babá estará orientando, abençoando e punindo, se necessário, fazendo o papél de um verdadeiro pai, presente entre seus descendentes para aconselhá-los e protegê-los, mantendo assim a moral disciplina comum às suas comunidades, funcionando como verdadeiro mediador dos costumes e das tradições religiosas e laicas.
Finalizando a conversa com os fiéis e já tendo visto seus filhos, Babá-Egum parte, a festa termina e a porta principal é aberta: o dia já amanheceu. Babá partiu, mas continuará protegendo e abençoando os que foram vê-lo.
Esta é uma breve descrição de Egungum, de uma festa e de sua sociedade, não detalhada, mas o suficiente para um primeiro e simples contato com este importante lado da religião. E também para se compreender a morte e a vida através das ancestralidades cultuadas nessas comunidades de Itaparica, como um reflexo da sobrevivência direta, cultural e religiosa dos iorubanos da Nigéria.
Por Manoel Gomes Filho


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